7. Regresso ao Futuro 2 (O Que Vem Amanhã)
- Miguel João Ferreira
- 18 de dez. de 2017
- 5 min de leitura
Amanhã não está longe: é já amanhã. Entre hoje e o dia que amanhã será hoje e que hoje parece ser só amanhã, separam-nos umas míseras 24 horas. Entre hoje e o futuro, o futuro de progresso e desenvolvimento tecnológico a que hoje chamamos ficção científica, a distância não é muito maior. Nano é a nova medida das coisas; e não só está para ficar como há-de reduzir-se, a cada dia, na escala de grandezas.
Amanhã, que já vai acontecendo, teremos implantação de memórias; prolongamento da vida; inteligência artificial (muito além das capacidades que agora lhe antevemos); discussões éticas alargadas a fronteiras a que não pensaríamos alguma vez aplicá-las; exploração dos recursos naturais de novos modos sustentáveis ou, em caso de erro, numa inconsciência destructiva sem adjectivação; preocupações acrescidas de sustentabilidade e sobrevivência; movimentos migratórios de dimensões demográficas inimagináveis e para lugares ainda mais improváveis (interplanetária, por exemplo).
Amanhã espera-nos (confortavelmente sentada no hall das nossas possibilidades) a Zero-size Intelligence, em chips de menos de 5 átomos. 0 de Inteligência é para nós um insulto. Para um computador é uma qualidade: a maior capacidade possível no menor espaço possível.
Amanhã será literal a frase épica de Buzz Lightyear (Toy Story, 1995, John Lasseter): «to Infinity and beyond!». A exploração espacial promete fazer “quilómetros-luz” até 2021, pondo tripulações na lua e a correr à lupa o deserto de estrelas. Já se oferecem por fortunas viagens ao espaço e a venda de bilhetes promete tornar-se numa indústria competitiva. E um dia pode ser que se colonize efectivamente esse espaço e que, os bilhetes, que hoje os magnatas pagam ao preço do ouro, sejam dados de graça, como castigo, aos operários, aos pobres, aos destituídos, aos dissidentes, aos criminosos, como feito no passado nos tempos das colonizações europeias nas Américas e em África, para trabalhar as minas de Marte por um qualquer metal ainda por descobrir.
Amanhã haverá um Elevador Espacial — prevê-se que este absurdo esteja a meras 4 a 5 décadas de ser um facto provado — de c. 93.205 km que fará a ligação, não entre o rés-do-chão e o 90º andar de um arranha-céus americano, mas entre a Terra e uma estação espacial.
Amanhã o Neuro-hacking será um conforto para a preguiça de comunicar — ou um perigo real: A frase «não te leio os pensamentos» será uma mentira. Os neurocientistas estão a encontrar formas de ler os pensamentos com recurso a máquinas, formas muito mais elaboradas e completas do que um mero detector de mentiras. Na Universidade de Berkley, California, EUA, fizeram-se progressos reais; e não apenas aqui. Já se faz a tradução de actividade cerebral por meio da descodificação de impulsos eléctricos, ondas cerebrais, levando a progressos, por exemplo, na cura da demência. Uma espécie de tratamento como o que teve Alex em A Clockwork Orange (1971, Stanley Kubrick), mas com propósito e efeitos positivos. Será que ao som da 9ª Sinfonia de Beethoven? Poderá não ser de Beethoven, mas espera-nos; parece óbvio, uma nova Sinfonia da Mente — que será dos nossos pensamentos? Saber que poderão roubar-no-los, que poderão aceder-lhes, máquinas e Homens, empresas e governos, que poderão ser pirateados, como filmes nos torrents, traficados como orgãos no mercado negro, não é mais constrangedor do que estarmos nus numa rua cheia de gente?
Amanhã será a era dos Mass Data. Tudo está em linha, tudo pode e vai ser processado, na front Web, na deep Web — quem controla os dados? Luciano Floridi, um especialista na exploração e esforço de compreensão da 4ª Revolução Tecnológica diz-nos:
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A informação é a base da sobrevivência das células e das espécies. Somos feitos de informação genética. Células e bactérias comunicam entre si. Tudo é informação e comunicação dessa informação com o propósito biológico elementar de a) sobreviver; b) imperar na cadeia de sobrevivência. Somos organismos informacionais e essa é uma característica comum a qualquer organismo, multi ou unicelular. Se tudo é informação, sobreviver é compreender e aplicar a informação; imperar na cadeia é gerir a informação. Gerir a informação é gerir a incerteza:
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Informação = o que sabes: «Sei que existe um monstro no bosque».
Insipiência = o que sabes não saber: «Sei não saber onde o monstro se esconde».
Incerteza = dúvida sobre as respostas.
Ignorância = não se colocar as perguntas.
Insipiência + Incerteza = Incerteza = coisas para as quais não tenho uma resposta.
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Informação = Uma Pergunta + Uma Resposta.
Informação (Aristóteles) = Uma descrição da realidade sobre a realidade.
Incerteza = Só uma pergunta.
Ignorância = Não se coloca a pergunta, não tem pergunta nem resposta.
Só Resposta = Publicidade.
Só Pergunta = Incerteza.
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Quem controla a Incerteza = Poder.
Poder = Gestão das Perguntas
Logo,
O Poder é o controlo da incerteza. Daí a importância de saber e do sentido crítico: Quem controla as perguntas, dá forma às respostas; quem dá forma às respostas, controla a realidade.
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Territorio = Mundo
Mapa = Informação sobre o Mundo
Não se controla nada se não se tem acesso à informação (aos dados):
Quem possui os dados não possui o que quer que seja, se não lhes tiver acesso.
Disponibilidade do acesso é um conceito chave.
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O Controlo da Acessibilidade dos Dados é uma questão de Poder. A guerra dos dados, de toda a massa de informação sobre todos em linha (rasto ou pegada digital) está aí para ficar. De governos a grandes empresas todos os querem e o perigo do desaparecimento do acesso gratuito à informação é cada vez maior e a cada dia novos lobbys aparecem das sombras para procurar ocupar o seu espaço, ter a sua fatia dos dados. Dados controlados por governos e corporações, manipulados para condicionar e modificar a opinião pública; máquinas e algoritmos usados para criar um sentido institucional podem efectivamente substituir (para as massas sempre mais ignorantes, deseducadas, desinformadas — contrasenso da era da informação) a tomada de decisão individual. Por cada vez que interagimos com o mundo e, no universo físico ou digital, deixamos a nossa digital print, indisfarçável pegada, e algo acontece à nossa informação — Há claramente um novo sentido para a histórica frase de Júlio César, ao atravessar o Rubicão, os dados estão lançados. A questão, porém, já não é de sorte ou de resultado; é antes: Quem os tem?
Amanhã haverá Quantum Control, um supercomputador microscópico que dispensa circuitos e funciona a luz e som. QED, electrodinâmica quântica. Matéria e luz interagem, alimentando o chip da máquina; vibrações sonoras fazem mover o motor. Deus joga aos dados, negando Einstein na sua disputa com Niels Bohr e os quânticos; e esse Deus é o Homem. Por quanto tempo?
Amanhã multiplicar-se-ão os movimentos juvenis com base na tecnologia, numa extensão mais comum da Primavera Árabe de 2001 (Praça Tahrir, Cairo, Egipto). Sabotagem tecnológica, ciber-consciência-cívica… Um ou outro, é o poder da rede.
Amanhã a Tecnologia é Nano: não só nos circuitos dos nossos aparelhos informáticos, também, e mais importante, nas nossas veias: a redução à escala nano permite (como uma conversão matemática de km para m para se fazerem cálculos na mesma medida) a conversão dos instrumentos de cura (em casos clínicos) para a dimensão das células, das bactérias, dos vírus, dos mais pequenos (e mais importantes) elementos do nosso corpo. A cura e a doença poderão finalmente comunicar ao mais pequeno detalhe. A medicina estará num nível que promete, dentro de 100 anos, qualquer coisa parecida com a imortalidade. Olá Prometeu! Os Homens têm um novo fogo sagrado. O pequeno pode ser gigantesco, nas suas possibilidades:
25,4 milhões de Nanos cabem num centímetro. Quantos nos cabem na palma da mão?
Amanhã reinarão as Dark Networks. Grupos anárquicos, dissidentes ou de mero protesto e contestação como o Anonymous (caracterizado pelo seu icónico uso de máscaras do histórico Guy Fawkes que em 1605, na Gunpowder Plot, quis, a custo da própria vida, reduzir a átomos o Parlamento Inglês) saltarão de cada esquina digital ou analógica para assaltar o status quo incauto.
Amanhã haverá Tradutores Universais, Avatares, Substitutos (surrogates), Cyborgs, ao nosso lado num café de bairro a tomar o pequeno-almoço; ou a roubar-nos o emprego, segundo um medo comum.
Amanhã é já hoje, quando a meia-noite bater a última badalada e mudar, num único segundo, para a quadrícula seguinte dos nossos calendários. Afinal, o Futuro é uma distância que acaba muito depressa.
(Artigo de: Miguel João Ferreira)
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